Inteligência Sistêmica Luto Perdas

O conceito de morte é excessivamente complexo: distorções que afetam a expressão do luto

O morrer e o processo de luto estão intrinsecamente ligados e são, ambos, muito complexos, abrangendo diversas dimensões que vão além do simples evento biológico. Destaco aspectos sociais, psicoemocionais, físicos, espirituais e intelectuais como dimensões que envolvem o morrer e o luto. 

A morte é essencialmente uma “não experiência”, porque obviamente não passamos pela experiência da morte até morrer de fato. Apesar de existirem muitas informações que giram em torno deste assunto de experiência de quase morte, é QUASE morte, a pessoa não morreu e voltou à vida. É uma abstração, uma conjectura. Dito isso, a morte é sempre percebida de fora. O conceito de morte é sempre relativo, e muda de acordo com: 

  • o contexto situacional;
  • a maneira com que o indivíduo se relaciona; e
  • os comportamentos singulares de cada pessoa envolvida na experiência. 

Sempre gosto de enfatizar a importância dos laços emocionais e os vínculos de afeto que construímos na infância para perceber a forma como enfrentamos a perda e a morte. A perda de um ente querido (ou mesmo de um objeto) pode desencadear uma intensa necessidade de busca por proximidade e apoio emocional, assim como dar gatilhos de cicatrizes emocionais de vínculos afetivos inseguros do passado, e promover fatores de risco no que compete a elaboração de um luto natural. O luto está totalmente ligado à qualidade do vínculo que temos com aquela pessoa que se foi e também à maneira como nos encontramos internamente quando a ruptura acontece.

Ao vivenciar uma experiência como essa, podemos nos deparar com diferentes tarefas para alcançar uma adaptação saudável à perda, e algumas podem, inclusive, ser muito salutares. Uma delas, por exemplo, é aceitar a realidade da perda, lidar com a dor emocional, ajustar-se a um ambiente onde o falecido está ausente e encontrar uma maneira de manter uma ligação emocional saudável com a pessoa falecida enquanto a pessoa ainda viva segue com a própria vida. É claro que o luto não é linear, muito pelo contrário, é dinâmico e oscilatório, mas entrar em contato com a perda, seguir o processo de luto resolvendo as dores dia a dia, assimilando as perdas e a adaptação na reorganização do mundo, ajuda na assimilação e restauração do bem estar.

As pessoas enfrentam uma série de emoções ao lidar com a morte iminente ou real, e/ou após a separação de alguém ou de alguma coisa. Vale lembrar que quase todos os seres humanos afligem-se com a perda de um ente querido em algum grau. Alguns sentimentos e comportamentos são naturais, como por exemplo: desamparo, tristeza, negação, raiva, depressão, alívio, saudade, torpor, desespero, libertação, aceitação, embora seja importante ressaltar que nem todas as pessoas passam por todos eles de maneira linear ou sequencial. Além desses aspectos psicoemocionais, a dimensão social da morte também é crucial. A maneira como uma sociedade lida com a morte, seus rituais funerários e sistemas de apoio podem influenciar significativamente a experiência do luto. 

Agora, falando em termos físicos, a morte pode envolver dor e sofrimento físico, tanto para o moribundo quanto para os que estão ao seu redor. O cuidado paliativo e a medicina paliativa buscam aliviar esse sofrimento físico, proporcionando conforto e qualidade de vida aos pacientes terminais. E só atingimos grandes avanços nos cuidados paliativos recentemente com a medicina recentemente.

Já a dimensão espiritual da morte refere-se às crenças e práticas religiosas que moldam a forma como uma pessoa compreende e enfrenta a morte. Para algumas pessoas, a morte é vista como uma passagem para outra vida ou como parte de um plano divino, enquanto para outras, pode representar o fim absoluto da existência. Cada um escolhe o que melhor compete para o enfrentamento da sua dor, o que lhe traz alívio e não causa fadiga e confusão mental.

Por fim, a dimensão intelectual da morte envolve questões filosóficas e existenciais sobre o significado da vida e da morte. Filósofos e pensadores ao longo da história têm explorado essas questões profundas, oferecendo uma variedade de perspectivas sobre o tema. Além disso, o intelecto pode causar desorganização, falta de concentração, desorientação e negação. 

Em suma, existem sofrimentos que fazem parte da vida, são necessários e fogem ao nosso controle, e não somos nós que os criamos. A morte existe, é inevitável e inescapável para todos nós. Assim como a morte, o luto também é inevitável e, mais cedo ou mais tarde, terá de ser vivido. A forma como compreendemos e percebemos a morte (e o morrer) em suas diversas dimensões pode ajudar as pessoas a lidar de maneira mais eficaz com essas questões tanto em nível individual quanto coletivo.

Enfim, o conceito de morte é complexo e multifacetado, envolvendo muitos aspectos pertinentes a esta vivência, cada processo de luto de uma pessoa é como nenhum outro processo de luto, e respeitar isso é praticar suas virtudes de sabedoria!

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